Caro Manuel Gomes
Na
Líbia de Kadhafi - I
O calor continua,
embora talvez um bocadinho mais brando, e a Internet (ou será a operadora?) não
tem emenda: a fraqueza do sinal persiste, acrescida de intermitências, talvez
influenciadas pelas Intermitências da
Morte da autoria do meu vizinho azinhaguense José Saramago. Quente por
quente e sem intermitências, lembrei-me da Líbia.
Com início em 30
de Outubro de 1976 e com a duração de 3 dias, teve lugar no Porto o II Congresso
do Partido Socialista, então responsável pelo I Governo Constitucional. O Dr
Mário Soares era o Primeiro-ministro, o meu saudoso amigo José Medeiros
Ferreira o Ministro dos Negócios Estrangeiros e eu estava de novo no Ministério
da Administração Interna. Um dos convidados foi o poderoso Ministro dos
Municípios Líbio, Abuzaid Dourda.
Medeiros Ferreira,
como MNE e socialista diligenciou, e bem, para que se tornassem agradáveis e
talvez frutuosas para nós as estadias em Portugal dos convidados em geral. No
caso do ministro líbio, dada em particular a sua área de tutela, poderia eu
recebê-lo? À resposta afirmativa correspondeu o convidado, acompanhado por um
intérprete, o Encarregado de Negócios da Líbia no nosso País e dois adjuntos,
cujas tarefas específicas no seu País nos eram desconhecidas. Ter-se-á falado
do tempo que corria, dos navegadores, das descobertas, de Vasco da Gama (Pedro
Álvares Cabral, Bartolomeu Dias e outros ilustres navegantes são com frequência
preteridos nestas coisas…), de Camões, dos “tempos” que corriam em Portugal e
na Líbia e do surto de desenvolvimento que ali se verificaria. A conversa
decorreu amena com uma lhaneza e trato simples de que guardo boa recordação e,
a certa altura, o ministro líbio endereçou-me o convite para visitar a Líbia, o
que eu agradeci, manifestando-me sensibilizado.
-
A Líbia – nome provindo da Grécia no sec II aC - estava nessa altura em plena
implantação da Jamahiriya (Estado das massas). (um neologismo incorporando
república e massas).
-
O país compõe-se tradicionalmente de três partes: a Tripolitânia a norte, a
Fezânia a sul e a Cirenaica a leste. Ao longo da sua história estas regiões
foram ocupadas por árabes e nómadas berberes, fenícios, gregos (sec VII aC),
cartagineses, romanos (sec I aC a VI dC), vândalos (sec V dC), bizantinos,
árabes (sec VII dC), otomanos (sec XVI) e mais recentemente, turcos, egípcios,
italianos, ingleses, franceses...Em 1911 a Itália declarou guerra ao Império
otomano e em 1912 a Turquia renunciou aos seus direitos sobre a Líbia; em 1914
todo o país estava ocupado pelos italianos, reeditando os seus ancestrais
romanos, excepto o interior do deserto, das tribos sanussi, insubmissas; em
1939 a Líbia foi incorporada no Reino da Itália; durante a II GGuerra foi palco
de intensos combates entre o Afrikacorps de Rommel e as tropas inglesas de
Montgomery e, finda ela, o Reino Unido encarregou-se do governo da Cirenaica e
da Tripolitânia, na costa mediterrânica, e a França passou a administrar Fezã,
o interior; em 1 de Janeiro de 1952 a ONU aprovou a independência da Líbia como
Reino Unido da Líbia; em 1954 houve a concessão de bases militares aos
norte-americanos – donde também forte influência económica, como também
inglesa; em 1959 são descobertas jazidas de petróleo e a exigência líbia da
retirada das forças estrangeiras; em 1961 tem início a exploração do petróleo;
em 1 de Setembro de 1969 partiu de Sebha o golpe militar chefiado pelo coronel
Mahmud Sulayman al-Maghribi logo substituído por Muammar al-Gaddafi (ou
Kadhafi) (tenente de 27 anos!) quase sem derramamento de sangue, sinal da
insatisfação então reinante, e veio a ser implantada a República Árabe da Líbia
(1969-1977) (com o lema, evidentemente, “liberdade, socialismo e unidade”), com
a deposição do rei Idris; em Abril de 1974 Khadafi colocou-se mais como “líder
espiritual da Revolução” do que em tarefas executivas; em 1977 o país passou a
designar-se oficialmente por Jamahiriya Árabe Popular Socialista da Líbia e em
1986 veio a adoptar o prefixo Grande; entre 1980 e 1990 apoiou abertamente o
terrorismo internacional; em Fevereiro de 2011 teve início uma guerra civil que
veio a conter a morte de Gaddafi em 20 de Outubro. (in Google)
-
Gaddafi nasceu numa tenda em 7 de Junho de 1942, próximo de Sirte, numa família
de berberes beduínos; cultivou o exotismo dessa instalação em deslocações no
estrangeiro, como aconteceu em Lisboa,- S Julião da Barra - Oeiras- na Cimeira UE-África,
em 1977.
São
Julião da Barra / Oeiras.
Verdade seja que
não tinha a mínima ideia de concretizar essa aceitação, excepto se ela fosse
considerada de reconhecido interesse geral, dado que se podia tratar
essencialmente de uma gentileza. Todavia, passado algum tempo, começou a haver
uma repetida insistência do Encarregado de Negócios para que a visita se
verificasse.
Desconhecia por
completo a vivência em territórios árabes e em particular, na circunstância, na
Líbia, pelo que pedi ajuda ao meu querido amigo Eng Guimarães Lobato –
administrador da Fundação Gulbenkian e Presidente do muito útil Conselho Superior
de Obras Públicas (fizemos, os dois casais, uma inesquecível viagem a Macau-
suas origens-, Hong Kong e Londres em 1980). O Eng Guimarães Lobato, até pelo
seu acompanhamento dos interesses da Fundação no sector petrolífero, conheceria
o meio, as gentes e os seus costumes.
E assim era, de
facto. Recordo com muita ênfase o utilíssimo rol de informações que me transmitiu
e chego a pensar que, sem eles, a visita teria sido um fracasso se não mesmo
geradora de, pelo menos, desconforto diplomático na viagem realizada no início
de 1977.
É que, a seguir a
uma recepção cordial mas muito cerimoniosa no aeroporto de Trípoli, em sala
naturalmente reservada e bastante preenchida pela Comunicação Social local, eu
e o Dr José Manuel Andrade, meu único acompanhante e como secretário,
(economias …!) fomos instalados num hotel com muito boas condições.
O
hotel, inaugurado havia muito pouco tempo, tinha sido construído por franceses
que, ao darem-lhe a forma circular e talvez com alguma pressa na execução e
recebimentos, descuraram a altimetria topográfica da cofragem e betonagem do
corredor, em que duas pontas se encontraram com desnível entre ambas, mal
disfarçado pela passadeira e guarnições aprimoradas.
E aí ficámos, sem
programa, no resto do dia da chegada e no dia seguinte. Não fora os
esclarecimentos e prevenções que me foram dadas pelo Eng Guimarães Lobato, o
natural desconforto que apesar de tudo era natural que surgisse, não por mim
mas pelo que porventura ali representasse do meu País, poderia redundar em
qualquer atitude minha pouco consentânea com a desejável harmonia do relacionamento.
No terceiro dia
começou, então na prática, a visita: encontros com os Ministros da Justiça, da
Saúde e das Finanças e o Primeiro Ministro Abdessalam Jalloud, além do
anfitrião, é claro; deslocação, entre outros locais, a Léptis Magna para uma
vista geral e dos cuidados na sua recuperação;
Léptis Magna
Léptis Magna.
Léptis Magna.
Léptis Magna.
-
Interessante que a cidade, uma outrora muito importante cidade romana, tinha
uma parte substancialmente submersa no Mediterrâneo e outra bastante invadida
pela areia; no primeiro caso, confesso a minha ignorância, não sei se por
abatimento de terras, se por aumento do nível das águas ou se pelos dois
fenómenos mais ou menos contemporâneos; no segundo, claramente em consequência
dos ventos dominantes e da relativa proximidade do deserto. As estátuas que ali
restavam, por vandalismo religioso ou na II GG, tinham a particularidade de
terem, partidas, as saliências masculinas ou femininas …; dos mármores se dizia
que boa parte foi levada para França e estarão “preservados” em alguns
palácios.
Passeio pela
“Baixa” de Trípoli onde, acompanhados pelo estimabilíssimo Eng Mansouri, se viu,
entre outros destaques, o muito movimentado comércio do imperativo Souk e da
avenida principal.
-
O Souk , como é regra, era impressionantemente recheado de vasos, cântaros e
pratos em cobre artisticamente trabalhado, missangas reluzentes, adereços
coloridos e esfusiantes, relógios e joias, sacos e malas, frutos secos, panos,
tapetes e fatos, candeeiros e potes, eu sei lá…. Na avenida, de certo modo a
diversidade repetia-se, agora em mini-lojas urbanas mas também multifacetadas e
diversificadas
O Eng Mansouri, que estudou na Alemanha, fazia
uma sábia ponte entre os costumes europeus e os da sua terra, o que também me
valeu bastante. Percorrendo a avenida,
manifestei a intenção de comprar qualquer prenda para a minha Mulher, um
alfinete de filigrana local, coisa assim. Entrámos
numa das lojas onde alguns estavam na montra e houve um grande reboliço e
efusão de abraços entre os dois irmãos proprietários e o Engenheiro, pois que
eram muito amigos e já não se viam há imenso tempo. Convidaram-nos a subir para
o mezanino que a loja tinha, apesar de exígua. Aí nos sentámos por largo tempo
a tomar chá e a conversar em francês (!), findo o que os líbios falaram entre
si e na sua língua, de vez em quando com um olhar para mim, que procurava um
entretenimento qualquer para disfarçar o embaraço. Despedimo-nos efusivamente e,
cá fora, Mansouri abordou-me referindo que os seus amigos me queriam oferecer
um televisor sobre que eu tinha manifestado algum fugaz interesse. Disse-lhe da
minha surpresa, não era esse o fim da nossa visita àquela loja mas, se isso
lhes dava prazer, recebê-lo-ia como recordação do nosso muito agradável
encontro.
Os encontros,
conversas e passeios decorreram com progressivas e efusivas demonstrações de
afabilidade e confiança, o que coincidia com as referências que me haviam sido
feitas por Guimarães Lobato.
É assim que, na
despedida no aeroporto, se formou uma fila das altas entidades com quem havia contactado
para os cumprimentos individuais de despedida. Acompanhado pelo anfitrião
percorri a fila com um beijo duplo facial em cada um dos circunstantes, como os
costumes locais já haviam exigido, mesmo que um tanto desajeitadamente…
Subi a escada para
o avião e lá de cima, acenei em despedida final, no que fui correspondido com
apreciável exuberância.
Dirigi-me ao meu
lugar e, quando curvado por limitações impostas pelo porta-bagagens, procurava
acomodar-me, bateu-me no ombro um cidadão que, quando me virei para ele e aproveitando
a minha posição, que era facilitante, me ferrou dois beijos e me entregou uma
caixa relativamente volumosa:
era o televisor !!. (Vá
lá, era pequeno e a preto e branco!)
Não ! Não me
encontrei com Kadhafi ! Mas tenho pena !... Juntaria na memória a Ceaucescu e
Idi Amin .
Trouxe várias
coisas na bagagem, especialmente de artesanato local. Ao José Manuel Andrade
ofereceram mais ou menos as mesmas coisas, mas ou em menos quantidade ou mais
pequeno, com o que ele, e muito bem, se divertia, ou melhor, nos divertíamos os
dois.
Aparentemente mais
sólido, trouxe eu também o LIVRO VERDE de Kadhafi.
-
O Livro Verde continha o detalhe da sua doutrina sobre a “Terceira Teoria
Universal”, --“que foi descrita como uma combinação de socialismo utópico,
nacionalismo árabe e terceiro mundismo, que estavam em voga na época”(in
Google)-, a Jamahiryia, o “Estado das massas”, a sua forma de “poder popular”,
a “democracia directa”, uma governação administrativa assente em “municípios”
que tinham um peso determinante - o orçamento do de Trípoli comparava bem com o
nosso Orçamento Geral do Estado -, etc. (de in Google)
O livro, em
formato pequeno de ¼ de folha A4, tinha capa verde, que era a cor única da
bandeira nacional – donde o nome – e estava escrito em francês e árabe. Passado
algum tempo o Dr Nandin de Carvalho, muito curioso sobre a doutrina, pediu-me
cópia do livro. Tive todo o prazer em, em curto prazo, satisfazer o seu pedido:
enviei-lhe, em
primeira instância, uma cópia em…árabe !
Divertimo-nos!.
Na Líbia de
Kadhafi - II
“Depois
de chegar ao poder, o governo iniciou um processo de direcionar fundos para
fornecer educação, saúde e habitação para todos. As reformas, embora não
totalmente eficazes, tiveram o seu efeito. Sob Gaddafi, a renda per capita do
país subiu para.….,a quinta maior de África. O aumento da prosperidade foi
acompanhado por uma política estrangeira controversa, com o aumento da
repressão política em casa “(in Google) .
Regressado a
Lisboa e às minhas funções, no Conselho de Ministros seguinte reportei a minha
deslocação referindo as potencialidades, que se me afiguravam, de um
relacionamento económico, pelos vistos desejado. Fui acolhido com algum
cepticismo, um ou outro sorriso condescendente e a coisa, no que me respeita,
ficou por ali.
Mas afinal teve
continuidade, com a intervenção do Emb Seixas da Costa. https://duas-ou-tres.blogspot.com/2018/02/khadafi-madeira-e-nos.html
Passaram-se uns
tempos e fui convidado para assistir a umas sessões de esclarecimentos
promocionais de intercâmbios com a Líbia, que tiveram lugar no antigo Hotel Penta,
junto à Praça de Espanha, e em cuja organização tomou parte o Eng Guimarães
Lobato. Daí veio a resultar a deslocação de uma missão empresarial àquele país
da qual resultou o interesse, em princípio e quanto julgo saber, de sete
empresas, depois reduzidas a três e finalmente a uma: a Ilídio Monteiro
Construções Lda, tendo eu conhecido na altura o seu titular e o que foi o
início de uma muito boa amizade.
No final do primeiro semestre de 1981, saindo eu de administrador da
Hidroeléctrica de Cabora Bassa, recebi do Eng Ilídio Monteiro,primeiro por
intermédio do saudoso Eng José Varatojo – meu contemporâneo no liceu , e seu colega na Faculdade,- o convite para integrar a administração da sua
empresa, - a Ilidio Monteiro Construções- IMC - afecto, como vim a pretender, ao Sector Internacional e
Organização Interna, o que se verificou em 1 de Agosto seguinte, quando decidi
também passar à situação de reserva, o que aconteceu exactamente um mês depois.
Claro está que tive um número avultado de deslocações à
Líbia, especialmente via Madrid, o que não deixava de ser um bocado incómodo e
a estadia um tanto desconfortável, o que
se procurava amenizar. É certo que os estaleiros da empresa em Tripoli, aliás
como nos outros sítios, tinha condições bastante razoáveis em contentores
climatizados, o que contrastava bem com as instalações que tive em S. Salvador
do Congo em 1962/63. Mas eu já tinha a minha conta de “deslocações” e
afastamentos da família.
A
Empresa esteve em actividade simultânea na construção de infraestruturas em
quatro frentes :Trípoli, Sabratha ( ou Sábrata),Zliten e Sebba (ou Sebha),
diga-se de passagem, todas bastante aprazíveis.
- Por mera curiosidade refiro que a
IMC, nessas parcerias com as empresas municipais de construção, tinha contratos
de management-fee; o pessoal deslocado, gerido por IMC, tinha contratos
individuais em português e árabe; ambos os contratos foram muito sérios e bem
elaborados pelo meu colega Dr Pinto Cardoso, também advogado em Setúbal. Não
havia mão-de-obra local !
-Trípoli- é a capital, e a maior e mais populosa cidade da Líbia,
sendo a sede do governo central e administração. Etimologicamente, o nome
Trípoli vem do Grego Antigo (Trípolis) que significa "três cidades".
Foi fundada no século VII
a.C. pelos fenícios. Mais tarde, com a chegada dos romanos, a cidade adquiriu o
estatuto de cidade romana mais
importante da África. Pela cidade, foram passando cronológica e
historicamente vândalos, bizantinos, árabes, espanhóis, turcos, berberes e italianos. Os italianos permaneceram
em Trípoli de 1911 até 1951.
É o principal porto marítimo, centro comercial e
fabril do país. Devido à sua longa história, há uma multidão de enclaves
arqueológicos muito notáveis em Trípoli. É (ou era) uma das cidades mais modernas,
ricas e com um maior nível de vida da África (in
Google)
Royal
Palace Tripoli.
Em boa verdade, na Líbia, eu tinha dois oásis: o de Sebha,
de que falarei mais adiante, e a Embaixada do Brasil, em Trípoli, de
caracterizações manifestamente diferentes mas um tanto complementares…
O Embaixador do Brasil cuidava também dos interesses de
Portugal, que ali não tinha representação diplomática própria. A Embaixada era,
como em todo o lado, considerada território do país representado. Donde que a “Lei
Seca” que, como muitas outras proibições, tinha sido imposta com muitíssimo
rigor em 1969, não tinha ali aplicabilidade, pelo que ainda hoje agradeço ao
Brasil, através do Sr Embaixador, o facto de ali se poderem beber refrescantes
whiskeys para que os calores locais convidavam magnânimamente. Para além da
amena cavaqueira e, claro está, da descoberta da resolução de vários problemas
internacionais…
Houve uma ocasião em que os seus préstimos foram
valiosíssimos: um operário nosso assoou-se a um lenço verde,- coisa que terá
escapado nas informações e recomendações dadas antes da partida -, o que suscitou a indignação, real ou fingida,
de circunstantes líbios, sendo por isso detido pela polícia, com que aliás não
se brincava e sobre a qual eram fundados todos os receios.
Desde o século passado,a Líbia já teve seis
pavilhões.
- DE 1918 A 1923
- DA INDEPENDÊNCIA À MONARQUIA -1951 A 1969.
- DE 1969 A 1972: Após a revolução que levou Muamar Kadafi ao poder, o país adotou um novo
nome e um novo pavilhão. Sob o título de República Árabe da Líbia, inspirado no
Panarabismo, o país adotou as cores preta, branca e vermelha do movimento de
libertação árabe motivado pela deposição do rei Faruk pelo general Nasser, no
Egito, em 1952. A nova bandeira durou pouco: apenas três anos.
- DE 1972 A 1977: Um dos projetos de Kadafi foi a unificação de Líbia, Egito e Síria em uma
única federação, a Federação das Repúblicas Árabes. A unificação acabou não
dando certo, mas ganhou uma bandeira. Além das cores preto, vermelho e branco,
a flâmula ganhou um falcão dourado na faixa do meio.
- DE 1977 ATÉ 2011: Em repúdio ao acordo de paz do Egito com Israel, Kadafi adotou a bandeira verde,
cor do Islã, sem símbolos ou inscrições.
- A
PARTIR DE 2011.
A atual Bandeira da Líbia foi escolhida pelo grupo
opositor que depôs o coronel Muammar al-Gaddafi, em agosto de 2011, após a
Primavera Árabe. É igual à bandeira da Líbia adotada em 1951 como primeira
bandeira após o país se tornar independente da Itália.( in Google)
É que o acto, como
se está a perceber, foi tido como ofensa à bandeira.
Foi um problema
complicado obter o resgate do homem, que ainda saíu caro, tendo as conversações
corrido pela Embaixada brasileira.
Ele seguramente
nunca mais se assoou assim e quem soube também não.
Quanto a usos,
costumes e leis, os guardas da alfândega do Aeroporto de Trípoli tiveram pelo
menos dois episódios para guardar na recordação os portugueses ali deslocados:
saltaram a pés juntos sobre um embrulho com enchidos e presunto – a eterna
chico-espertice !– e afastaram-se angustiadamente de uma mala com postas de
bacalhau e roupa, que tresandava, para mais com aquele calor.
-
Sabratha tinha uma forte recordação romana, estava junto ao Mediterrânio e a
uns sessenta quilómetros a oeste de Trípoli;
Coliseu Romano de Sabratha.
-
Zliten, cento e sessenta quilómetros a leste de Trípoli, era também uma
estância balnear, coisa que não deixei de aproveitar;
A estrada que
levava a Zliten oferecia um passeio muito agradável pela variedade da paisagem
que a acompanhava. Passava-se, entre outros, por um grande palmar de altas
tamareiras, cheias de frutos. Eu, que gosto de tâmaras, fixava um bocado o
olhar nelas, desejando tê-las à mão. É que quando regressava a Lisboa, por via
de regra, trazia umas caixas delas. Só que importadas, tal como operários, da
vizinha Tunísia, … decerto porque aquelas, ou outras, estavam muito lá em cima.
-
Sebba (Sebha), a uns setecentos quilómetros a sul de Tripoli, no território
Fezã; era um largo oásis espantosamente ocupado por uma cidade e espaços agrícolas
(!); era conhecida como entreposto de escravatura; cidade de onde partiu
Kadhafi e seus companheiros na revolução;
Numa das visitas a Sebha fui convidado, com um outro
europeu ali de visita, para almoçar numa “quinta”, concretamente num pomar por
onde corria um regato (!). Era um ainda numeroso grupo à volta de dois
recipientes largos com carneiro em grandes nacos, - estufado se bem percebo de
culinária,- sobre cuscus. Acompanhado de sumos de frutas ou água. E todos sem
sapatos e sentados no chão, de cócoras com as pernas cruzadas à frente.
Os líbios usavam umas calças com os
fundilhos quase na curva dos joelhos, o que lhes facilitava a posição…
Mulheres ? Nem de longe se viam !.
A coisa não corria mal até o meu colega convidado me
dirigir uns olhares aflitos,
angustiados, de quem não sabia o que fazer. Vi depois a causa e passei eu a
estar também um bocado aflito: um dos nossos companheiros, líbio, com a maior
das descontracções, alternava mexer nos pés e ir ao recipiente buscar carneiro
ou cuscus, com a mesma mão, está claro !
Numa ocasião manifestei desejo de me internar um pouco no
deserto circundante e assim aconteceu. Um jeep e um motorista conduziram dois
cidadãos curiosos pela estrada que saía para sul (sim, estrada !). Coberta aqui
e acolá de areia, descoberta ali e além, conduziu-nos a ponto em que se não via
a cidade mas viemos a encontrar o que deliberadamente era procurado : torretes
de carros de combate emergindo no deserto. Assim se viram dois, que a natureza
dos ventos gentilmente tinha posto a descoberto para decerto voltar a cobrir.
Diziam que um alemão e outro inglês, eram afinal um monumento no deserto, de
acaso ou preparado deliberadamente para visitas como esta, em lembrança de quem
por ali combatera denodadamente .
A sensação de estar no deserto é estranha, quanto recordo,
com uma grande ansiedade causados pela solidão e ausência de apoios à vista e pelo desconforto do enorme calor que se fazia
sentir. Aconteceu até que, tendo sido nós um bocado imprudentes quanto às
reservas líquidas, juntava às outras sensações a de uma enorme sede, fazendo-me
recordar Eduardo III de Inglaterra e Shakespeare , que parafraseava
manifestando-me disposto a oferecer o meu reino por um refresco, que até podia
ser água…
Regressámos sem problemas.
Claro que no decorrer dos dois anos – 1981-1983- em que tive deslocações à Líbia, me encontrei
com o Eng Mansouri – manifestamente tenso – e fui convidado para casa de
quadros da empresa nacional com que a IMC estava associada. Só em duas ocasiões
me foi dado estar com as respectivas consortes: em casa do Eng Mansouri - com
mesa e cadeiras – e do director da empresa em Sebha, - claro que sentado,
desconfortavelmente, no chão – em que a senhora fazia o chá e não disse uma
palavra.
Percorri então também o Souk e a Avenida de outrora : muitas
lojas fechadas ou desertas e esvaziadas de gente e de bens!...
Mas uma boa experiência de vida, sob vários pontos de
vista.
Vou “recolher-me”
Um abraço e até breve
Manuel da Costa Braz
In
m/ pasta Para Memória Futura
Editado
em Out 2018